Respeito ao projeto gráfico

Respeito ao projeto gráfico

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O projeto gráfico de um veículo de comunicação, seja uma revista científica, seja um cartaz ou um website, na nossa visão, está atrelado à função editorial designada ao produto. O projeto editorial de um jornal diário local não é o mesmo de uma revista como a Nature, assim como o planejamento editorial de um house organ impresso difere bastante daquele de um website institucional. Assim, necessariamente, o projeto gráfico de um produto tem de considerar o projeto editorial em primeiro lugar.  Já escrevemos aqui sobre a importância do Projeto Editorial.

Diferentemente do passado, quando a composição das páginas era dificultada por poucos recursos técnicos (linotipos, montagem em fotolito), a era dos programas de diagramação (PageMaker, QuarkXpress, InDesign) trouxe flexibilidade e liberdade para o trabalho do diagramador. É realmente possível fazer quase tudo numa página hoje! Porém, num projeto gráfico bem construído, certos limites precisam ser estabelecidos e seguidos, para que o visual da página individual não fique comprometido.

Antigamente, na produção de jornais, não tínhamos como interferir, por exemplo, no espaçamento entre letras ou entre palavras. Os jornalistas tinham que ser hábeis na construção de títulos que se encaixassem perfeitamente na largura das colunas, considerando que letras como m, n ou o ocupam mais espaço na largura do que i, t, l. No jornal Diário Popular, onde trabalhei, havia até competição entre os editores sobre quem conseguia acertar um título de primeira! Hoje, o jornalista escreve o título que quer e deixa para o diagramador a tarefa de “fazer caber”. Porém até que limite o diagramador pode “espremer” ou “esticar” uma linha ou um parágrafo? O tamanho dessa liberdade é diretamente proporcional à qualidade visual do produto final: uma linha esticada demais logo acima de outra, espremida demais, mostra ao leitor falta de cuidado na composição gráfica daquele produto.

Esses limites, determinações e possibilidades precisam ser determinados por um projeto gráfico de periódico. Além de ser positivo para o produto em si, o projeto gráfico também facilita a vida das equipes. Assim como o projeto editorial (sobre o qual já escrevemos), o projeto gráfico torna o briefing para contratação de pessoal muito mais fácil em caso de troca de diagramadores ou de produtores de texto. Dessa maneira, todos atuarão com base em um documento, uma norma preestabelecida, que serve como guia. Se existe muita rotatividade na contratação de profissionais (no caso, por exemplo, de free lancers), todos precisam operar segundo um código comum, para que o editor tenha chance de cuidar do conteúdo e do direcionamento do produto, e não de detalhes como uma linha que escorregou para outra página ou uma palavra hifenizada incorretamente.

Em se tratando de revistas científicas, o projeto gráfico precisa considerar alguns elementos sensíveis, tais como a escolha de fontes adequadas para a leitura de textos que podem ser longos (em oposição aos textos publicados na internet, por exemplo) e a composição de figuras do tipo organograma. Outro elemento importante é a previsão de modelos de tabelas, grandes ou pequenas, e seus títulos e legendas, de maneira que a disposição de dados numéricos, muito comuns em publicações científicas, fique clara para o leitor. A previsão de hierarquia de títulos, subtítulos e intertítulos precisa ser estabelecida num projeto descrito num documento, de maneira que qualquer profissional designado para trabalhar com o produto possa saber como se portar nas diferentes situações.

Exemplos de como o projeto gráfico pode ajudar: o que fazer quando uma tabela não “cabe” na página onde deveria estar? Encolher? Pular a página? Quebrar em duas páginas? Como proceder no caso de títulos muito longos? Como tratar casos de “viuvinhas”, “linhas órfãs” e outras anormalidades assim, que produzem efeito visual de descuido e podem facilmente ser evitadas. São erros gráficos básicos.

É claro que o documento do projeto gráfico (que é composto não somente de imagens ou modelos de páginas, mas principalmente de texto descrevendo as situações) pode e deve ser alterado de vez em quando conforme a prática diária exija (por exemplo, quando novas situações, seções ou elementos surgem e precisam ser desenhados e previstos no projeto). Porém a oficialização do documento de projeto gráfico confere uniformidade para o veículo de comunicação.

 

Órfãs, viúvas ou “forquinhas” ou “enforcadinhas”

Estes termos estão longe de serem técnicos ou científicos: há muita discordância entre diferentes diagramadores ou editores sobre essas definições, mas basicamente,

  • Viúva: palavra solitária ou linha isolada no início de uma página ou coluna, “escapando” de outra página ou coluna. Em qualquer caso, ela foi abandonada!
  • Forca, ou “enforcadinha”: pedaços de palavras que foram hifenizadas e que ficaram no final de um parágrafo, sozinhos
  • Órfã: linha ou palavra isoladas na última linha de uma página.

viuvinhas

 

Patricia Logullo é doutora e meta-pesquisadora no Centre for Statistics in Medicine (CSM) na University of Oxford, Reino Unido e medical writer certificada pela International Society of Medical Publication Professionals (ISMPP). Além do Doutorado em Saúde Baseada em Evidências (pela UNIFESP), também é mestre em Ciências da Saúde (pela FMUSP) e Jornalista Científica (pela UNICAMP).

1 COMENTÁRIO

  1. Patricia,
    Sem dúvida alguma, por mais avançadas que sejam as ferramentas de redação, edição e finalização, o respeito ao projeto gráfico é o DNA do veículo, tanto eletrônico como digital ou mesmo papel.
    Beijos,
    Wagner

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