Títulos: como escrever, o que evitar

Títulos: como escrever, o que evitar

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Cientistas geralmente não recebem treinamento formal a respeito de como comunicar adequadamente seus resultados de pesquisa. Só recebem algum tipo de orientação de seus supervisores de mestrado ou doutorado, que podem ter… ou podem não ter essas habilidades. O resultado é que boa parte dos trabalhos submetidos para publicação nas grandes editoras de revistas científicas é composta de artigos longos demais, com clareza de menos e difíceis de classificar por assunto. Artigos que são devolvidos antes mesmo que os editores tenham paciência de lê-los. A melhor maneira de escrever um bom relatório científico é… começar direito. Pelo título.

Bom hábito é, realmente, começar pelo título. Muitos costumam escrever o título de um artigo por último, quando já redigiram todo o texto. Má estratégia. O título de um artigo tem duas principais funções: atrair a atenção dos leitores e ajudar na busca e na indexação do trabalho. Ora, se ao iniciar a redação de um artigo o pesquisador ainda não sabe sobre o que vai falar, é bem provável que o texto saia prolixo, fugindo ao tema, e que não mostre suas conclusões ou principais achados com clareza. Por outro lado, se redige o título inicialmente, tem mais chances de ater-se ao tema, de lembrar-se de relatar o principal achado e de deixar claro qual a utilidade daquele trabalho para o público.

Mesmo durante a realização da pesquisa científica, é um bom exercício pensar sobre qual seria o título do artigo ou dos artigos resultantes. Na hora de realmente começar a redigir o manuscrito, a primeira coisa a ser preparada, e cuidadosamente, é o título — mesmo que ele sofra alterações até a finalização do trabalho — pois ele pode ser a única coisa que os editores, os revisores das revistas e, finalmente, os leitores, vão ler. Esta é a regra número 1 da redação de títulos: redigi-los primeiro . Se desejamos chamar a atenção dos leitores que interessam e descartar os demais, é preciso fisgá-los na primeira oportunidade: o título.

Regra número 2 : concisão. Evitar palavras ou expressões desnecessárias, como “um estudo sobre” (está claro que é um estudo “sobre” algo, deve-se, ao contrário, dizer diretamente sobre o que é). Evitar títulos longos: quando ele está comprido demais, é sinal de que está muito generalizado ou muito específico. Se, ao redigir um título, ele ocupar várias linhas da página, esse é um mau sinal. É preciso tentar condensá-lo ao máximo. Muitas revistas atualmente limitam o número de caracteres ou de palavras do título, numa tentativa de facilitar a solução desse problema. Atenção às instruções para autores. Elas frequentemente nos ajudam a escrever melhor.

Regra número 3 : ação. Se o título contém uma ação, um verbo, de preferência conjugado na voz ativa, há enormes chances de chamar a atenção do leitor. “Tramadol no alívio da dor pós-operatória” é um título vago, que não revela o resultado do trabalho. “Tramadol alivia a dor no pós-operatório” conta-nos a história de um medicamento que foi testado, numa situação específica (o momento do pós-operatório) e que funcionou (aliviou a dor). “Fisioterapia na correção da cifose pós-traumática” nada nos diz sobre o que aconteceu com esses pacientes. “Fisioterapia não corrige a cifose pós-traumática” é muito mais informativo.

Regra número 4 : palavras-chave. Artigos são indexados por palavras-chave, mas a procura por eles em sites de busca na internet (incluindo as bases de dados científicas indexadas, como o Pubmed) varre não apenas as palavras-chave que foram escolhidas pelo autor, mas também, e principalmente, título e abstract. Em primeiro lugar. Assim, deve-se pensar em certas palavras-chave, arroladas nas listas Mesh e Decs*, que devem estar obrigatoriamente no título para chamar a atenção de pessoas que, como o redator do artigo, se interessariam por ele. Geralmente, o nome da intervenção (nova técnica, novo equipamento etc., conforme listados), o nome da afecção que está sendo tratada (exatamente como a lista Mesh) ou a população estudada (“adolescentes”, “idosos” etc.) mostram a que vem o texto.

(*As listas Mesh e Decs são vocabulários controlados para indexação de trabalhos científicos em periódicos médicos. São listas oficiais de termos que se deve usar como palavras-chave para indexar artigos. A Mesh pode ser consultada em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/mesh?itool=sidebar, e a Decs em http://decs.bvs.br/)

Sugestão: além de cumprir as regras acima, se seu trabalho é um estudo clínico randomizado ( randomized clinical trial , RCT), uma revisão sistemática ou uma metanálise, chame a atenção para isto no título. Estes são os desenhos de estudo de melhor evidência científica em medicina, e a simples inclusão dessas expressões no título (isso fica fácil após a adição de dois pontos) pode ajudar o leitor a encontrar o que mais interessa em sua pesquisa bibliográfica. (De outro lado, evite dizer “Relato de um caso de fratura do crânio em recém-nascido…”, preferindo simplesmente “Caso de fratura do crânio em recém-nascido…”; ou “Relato de série de casos de artroscopia em…”, preferindo “Artroscopia em…”).

Patricia Logullo é doutora e meta-pesquisadora no Centre for Statistics in Medicine (CSM) na University of Oxford, Reino Unido e medical writer certificada pela International Society of Medical Publication Professionals (ISMPP). Além do Doutorado em Saúde Baseada em Evidências (pela UNIFESP), também é mestre em Ciências da Saúde (pela FMUSP) e Jornalista Científica (pela UNICAMP).

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