Autoria de artigos científicos: quem pode assinar?

Autoria de artigos científicos: quem pode assinar?

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Como comentamos na última Dica do Centro de Estudos, muita dúvida tem surgido a respeito de quem pode e quem não pode (ou não deve) figurar num artigo científico como autor. Os critérios que definem autoria atualmente são objetivos e foram criados pelas revistas científicas internacionais, muitas delas reunidas em torno do Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (ICMJE). Eles servem para colocar limites na definição da autoria de pesquisas científicas, de maneira que os autores das publicações possam e devam se responsabilizar por elas.

Responsabilidade é, realmente, a principal chave da compreensão dos critérios de autoria (“Authorship criteria”) de manuscritos da área biomédica: a primeira exigência para que um profissional possa assinar um artigo é a resposta à pergunta: “você se responsabiliza pelos métodos e pelos resultados do trabalho que está apresentando?” Ou seja, aquele proponente a autor estaria disposto a responder legalmente por qualquer questionamento ético, técnico ou científico a respeito daquele trabalho? Se a resposta for “não” ou “não sei”, provavelmente é porque o autor não participou do planejamento da pesquisa, da escolha dos métodos adequados para a coleta de dados, não se envolveu com a análise das informações colhidas e sua interpretação e, portanto, não pode mesmo estar seguro de que teve tudo sob controle, tudo debaixo de seu olhar vigilante, tudo de acordo com o que considera adequado.

As orientações do ICMJE estão alinhadas com as do Comitê de Ética em Publicações (COPE) aos quais a maioria das grandes revistas é afiliada atualmente. Além disso, também a Associação Americana de Cirurgiões Ortopedistas (AAOS) estabelece padrões obrigatórios a respeito da responsabilidade sobre pesquisas científicas. O princípio comum a todas elas é de que alguém só pode dizer-se autor de um trabalho para o qual tenha feito “significativas contribuições”. Quais contribuições são as mínimas necessárias?

Autores de trabalhos científicos publicados em revisas biomédicas precisam ter participado de três atividades (e obrigatoriamente todas as três) para terem direito a assinar o texto:

1) design ou concepção inicial da pesquisa ou coleta de dados ou análise e interpretação dos resultados;

2) redação do manuscrito ou sua revisão crítica

3) aprovação final da versão a ser publicada.

Isso quer dizer que todo autor tem de necessariamente ter revisto a versão final e dado sua aprovação (o que representa uma maneira de se responsabilizar pela pesquisa). Todo autor precisa ter ajudado a escrever ou revisado criticamente o trabalho (melhor se for as duas coisas). E todo autor tem que ter participado ou do desenho (planejamento) do estudo, ou da coleta de dados ou da análise dos dados (estatística ou interpretativa).

Exemplo: se um pesquisador planejou o trabalho e teve colaboração de outros para coletar os dados, depois precisa redigir ou revisar o texto e dar aprovação final. Se outro pesquisador trabalhou apenas na coleta de dados de um trabalho, sem ter participado da sua concepção, mas redigiu e revisou a versão final, também pode ser considerado autor. Mas se apenas ajudou a planejar e depois nunca mais pôs olhos no texto a ser publicado, não pode se responsabilizar por ele. Portanto, não pode assinar. Se não planejou, não trabalhou na aquisição dos dados nem na interpretação deles (seu significado clínico, por exemplo), não pode ser autor, mesmo que tenha revisado a versão final de um texto que outros produziram.

Médicos que forneceram dados de pacientes com determinadas afecções para estudo, cirurgiões que operaram os sujeitos de uma pesquisa, técnicos que ofereceram orientações para análises (por exemplo, moleculares, estatísticas, linguísticas) não são autores (a menos que também se enquadrem nos critérios de autoria acima). Porém, situações em que a autoria não se justifica não precisam ser necessariamente casos de falta de reconhecimento: pessoas ou instituições que colaboraram indiretamente ou com apenas parte da pesquisa podem e devem receber agradecimentos, tema de nossa próxima Dica do Centro de Estudos.

 

Para ler mais:

http://www.icmje.org

http://publicationethics.org/code-conduct

http://www3.aaos.org/member/profcomp/research.pdf

Patricia Logullo é doutora e meta-pesquisadora no Centre for Statistics in Medicine (CSM) na University of Oxford, Reino Unido e medical writer certificada pela International Society of Medical Publication Professionals (ISMPP). Além do Doutorado em Saúde Baseada em Evidências (pela UNIFESP), também é mestre em Ciências da Saúde (pela FMUSP) e Jornalista Científica (pela UNICAMP).

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